LF Bittencourt

Como se comunicar com clareza

Há uma brincadeira bastante popular entre programadores: dizer que uma das melhores coisas da computação é não precisar conversar com ninguém. Pode ser divertido, mas certamente não é verdade: assim como qualquer outro profissional, programadores precisam se comunicar o tempo todo.

Pense, por exemplo, na linha do tempo de qualquer emprego. Você se comunica desde quando escreve seu perfil no LinkedIn e faz a primeira entrevista até quando dá bom dia aos colegas ou documenta um projeto. Goste você ou não, comunicação é fundamental.

Fundamental e irônica, pois você pode se comunicar perfeitamente sem dizer ou escrever nada (pense em emojis, libras e turistas se comunicando por gestos) e falar ou escrever até cansar e, ainda assim, não ser compreendido. Ou pior: ser mal interpretado.

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Ao contrário do que muita gente pensa, se comunicar com clareza não é falar bastante, mas sim dizer as coisas certas, de forma simples e compreensível. Esse detalhe deixa as coisas mais justas entre pessoas mais introspectivas e colegas mais comunicativos: pelo menos nesse sentido, todos têm as mesmas chances no mercado de trabalho.

O que não significa que seja uma tarefa fácil — graças ao nosso cérebro.

Como funciona nossa atenção

Quando falamos ou escrevemos, nossa tendência natural é acreditar que quem está nos ouvindo ou lendo prestará atenção em todas as palavras, nos mínimos detalhes de cada frase. Na prática, porém, não é bem isso que acontece. Nosso cérebro evoluiu para usar todo e qualquer atalho para poupar energia e faz isso até nas coisas mais simples, como prestar atenção ao que você diz ou escreve.

Resumidamente, nossa massa cinzenta vive tentando adivinhar as informações focando nas partes mais importantes e chutando o resto. Sabe quando você “lê” uma notícia apenas rolando a página e passando os olhos pelos subtítulos? É seu cérebro preguiçoso em ação.

O efeito colateral disso é que não temos paciência para pessoas prolixas. Explicações mais longas que o necessário soam como desculpas (mesmo quando não são), divagações nos fazem “perder o fio da meada” e livros densos como Cem Anos de Solidão são campeões de desistência.

Por isso, um grande truque para se comunicar com clareza é garantir que o cérebro seja bem alimentado com pistas sobre o que é importante. E a melhor forma de aprender a fazer isso é prestar atenção em landing pages.

Anatomia de uma landing page

Landing pages são páginas web simples extremamente focadas em algum tipo de conversão. Por conversão, entenda qualquer coisa que você deseje que o visitante da sua landing page faça, como baixar um app, preencher um cadastro em troca de um ebook ou deixar um depoimento.

Comecei a ler mais sobre landing pages no início de 2016, quando minha sócia e eu redefinimos nossas funções na Gongo e passei a cuidar também do nosso marketing digital. Como não tenho nenhuma formação na área, li muito sobre o assunto e descobri uma coisa interessante: landing pages são estruturadas cuidadosamente para prender a atenção dos visitantes.

Por isso, preste atenção nos conceitos abaixo. Mais adiante, eles vão fazer sentido e você verá porque landing pages são ótimos exemplos de como se comunicar com clareza.Cada elemento de uma landing page é pensado para “converter” o maior número possível de visitantes. O design extremamente funcional e o texto trabalhado minuciosamente seguem uma lógica progressiva pensada especialmente para o nosso cérebro preguiçoso: cada pedaço do conteúdo acrescenta um detalhe interessante para manter o visitante na página.

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Landing page do Gongo com headline, subheadline, texto com benefícios e CTA

Tudo começa com uma headline matadora, ou seja, uma frase de poucas palavras que sintetiza o valor do que você está oferecendo. A headline é o primeiro item visto pelo visitante e deve ser suficiente para que ele entenda completamente o produto ou serviço. Sabe por quê? Porque em boa parte das vezes, é só isso mesmo que ele verá.

Se a headline chamar a atenção, é hora de despertar interesse. Essa é a função da subheadline, um texto de apoio que detalha um pouco mais o produto ou serviço. Pelas razões que você já sabe, a subheadline também é curta, pensada para ser mais persuasiva do que falastrona.

Se tudo der certo e você conseguir chamar a atenção do visitante, ele topa ler um pouco mais e você tem alguns segundos extras de atenção para vender seu peixe. Nesse texto com os benefícios também não há espaço para enrolação. As frases e parágrafos são curtos e objetivos.

Por fim, temos também uma call to action ou CTA. Essa “chamada para a ação” é o elemento mais importante da landing page, pois é onde o visitante finalmente faz o que você quer que ele faça, ou seja, converte. Se a landing foi feita para ele baixar um app, por exemplo, o CTA é o botão de download.

Pronto. Agora que você já sabe criar ótimas landing pages, vamos ver como usar as mesmas ideias para se comunicar com clareza.

Antes de mais nada, diga o que você quer dizer

Se você quiser guardar apenas uma coisa desse artigo, guarde isto: a forma mais clara de se comunicar é simplesmente dizer o que você quer dizer, sem rodeios. É por isso que toda landing page começa com uma headline escancarada, para garantir que até o visitante mais distraído entenda a mensagem que ela quer passar.

Isso é especialmente difícil para nós, brasileiros, principalmente quando precisamos dizer “não”. Antes de negar, nós justificamos, pedimos desculpas, damos voltas e mais voltas. Se você já trabalhou com americanos (neste artigo eu digo porque isso é uma ótima ideia, caso você não tenha trabalhado), sabe melhor do que ninguém que eles não têm nenhuma dificuldade com isso. Pode parecer grosseria, mas eles apenas vão direto ao ponto.

Um exemplo fácil e um bom ponto para praticar são perguntas que podem, ou melhor, devem ser respondidas com “sim” ou “não”. Por exemplo: > Você conseguiu acabar o trabalho?

Você pode fazer uma dúzia de considerações, mencionar todos os colegas que ajudaram (ou não) a concluir a tarefa ou até mesmo reclamar que o computador lento diminuiu sua produtividade, mas faça isso depois de dizer “sim” ou “não”.

Encare essa resposta objetiva como uma demonstração de respeito ao tempo do seu interlocutor e não tenha medo de parecer ríspido, pois você pode complementar sua resposta depois usando a mesma lógica progressiva das landing pages.

O “sim” ou “não” é a sua headline. Quem fez a pergunta já tem a resposta que queria e pode encerrar a conversa sem nenhum problema depois dessa única palavra. Se ele ou ela demonstrar interesse e quiser saber mais, escolha sua consideração mais importante e faça dela sua subheadline. E assim por diante, tomando o cuidando de ser suscinto e priorizando o essencial a ser dito.

Clareza = simplicidade

Ao falar e escrever, preze pela simplicidade. Você verá que simplificar as coisas é surpreendentemente difícil, mas aqui vão algumas dicas práticas que vão ajudar a deixar as coisas mais simples:

Se estiver escrevendo:

E como diria George Orwell, um dos meus autores preferidos, quebre qualquer uma dessas regras antes de escrever alguma barbaridade.

Deixe claro o que você quer

Assim como nas landing pages, o call to action é uma parte muito importante da comunicação quando você quer que a outra pessoa faça alguma coisa. Você precisa deixar isso extremamente claro, pois todo o esforço de comunicação irá por água abaixo se ele ou ela não der esse próximo passo.

Os CTAs do cotidiano são mais sutis que os botões das landing pages e por isso são um pouco mais difíceis de notar. Como exemplo, imagine que você precise receber um relatório até o fim do dia. Nesse caso, a ação desejada é exatamente essa, que alguém envie o relatório até o fim do dia. Já a chamada para a ação é como você deixará isso o mais claro possível para essa pessoa.

Aqui, a regra de ouro também vem das landing pages: foque em uma única ação. Como você viu, nossa atenção segue suas próprias regras e, sendo honesto, fazer com que alguém faça uma única coisa já é uma tarefa suficientemente complicada. Várias ações? Esqueça.

Por isso, evite enviar aqueles emails pedindo mil coisas. Se pedir tudo isso for realmente necessário, priorize a coisa mais importante e a peça primeiro. Se a comunicação fluir, você terá oportunidade de pedir as outras na sequência. Não se afobe: se você insistir em pedir tudo de uma vez, as chances de você ser atendido vão cair drasticamente.

Por fim, lembre-se que seu CTA é como um botão em uma landing page. Ele é a parte mais importante da comunicação e precisa ser visto e entendido. Deixe claro o que você quer que a outra pessoa faça e evite fazer suposições sobre o que ela sabe ou não. Na dúvida, é sempre melhor pecar pelo excesso.

Conclusão

Se comunicar com clareza é difícil e depende de uma séries de fatores, como resumiu de forma irretocável o escritor francês Bernard Werber: > Entre o que eu penso, o que eu quero dizer, o que eu acredito que eu digo, o que eu digo, o que você quer ouvir, o que você acredita ouvir, o que você ouve, o que você quer entender, o que você acha que entende, o que você entende… São dez possibilidades de termos algum problema de comunicação. Mas vamos tentar mesmo assim…

Porém, com alguma dedicação, todo mundo pode se comunicar de forma mais clara e simples. Ser mais articulado fará você expressar suas ideias com mais facilidade e ser entendido, uma belíssima habilidade para sua carreira e quaisquer outros relacionamentos interpessoais.

Como disse Werber, não custa tentar.

Written on Nov 7, 2016.